Olá! Levando em consideração o
fato de estarmos passando pela Semana da Consciência negra, que tem como
norteadora o dia 20 de novembro, em que se comemora o Dia da Consciência Negra,
remeto ao texto de Stuart Hall, no qual ele já propõe um questionamento já no
título: “Que Negro é esse na Cultura Negra?” Creio ser pertinente que
reflitamos acerca de acontecimentos atuais com base nas reflexões de Hall para
que possamos perceber a importância do que se está comemorando, que não se
contém apenas em uma semana ou um feriado (em alguns municípios o Dia da Consciência
Negra é estipulado feriado), constitui um firmamento étnico de respeito tanto à
raça quanto à cultura negras. A seguir, segue uma leitura do ensaio de Hall,
acompanhada de acontecimentos recentes e de importante relevância para a conquista
dos direitos étnico-raciais.
Hall inicia o seu ensaio com uma
pergunta – Que tipo de momento é este para se colocar a questão da cultura
popular negra? – e é com base nela que discorre o seu texto. Ao falar de “momento”,
o autor nos lembra que devemos ter em mente que eles têm sua especificidade
histórica, uma vez que estes são sempre conjunturais. Ainda que estes momentos
apresentem semelhanças e continuidades com outros momentos, jamais poderão ser “o
mesmo momento”. E essa reunião do que é semelhante e diferente que definirá não
só a especificidade do momento, como também a especificidade da questão, logo, “as
estratégias políticas com as quais se tenta intervir na cultura popular, bem
como com a forma e o estilo da teoria e crítica cultural que precisam
acompanhar essa combinação” (p. 337).
Para melhor compreender essa
especificidade do momento, Hall apud West aponta três grandes eixos: “O
primeiro é o deslocamento dos modelos europeus de alta cultura, da Europa
enquanto sujeito universal da cultura (...); O segundo é o surgimento dos EUA
como potência mundial e, consequentemente, como centro de produção e circulação
global de cultura (vale lembrar que esse surgimento ocorre de maneira
simultânea, pois há ‘o deslocamento e uma mudança hegemônica da definição de
cultura)’; O terceiro eixo é a descolonização do Terceiro Mundo, marcado
culturalmente pela emergência das sensibilidades descolonizadas”. (p. 335-6).
Fica evidente que todos estes três eixos estão inseridos no contexto americano.
Para o referido autor esse descentramento
e/ou deslocamento de que fala em um dos eixos representa uma abertura para
novos espaços de contestação, causando assim uma importante mudança na alta
cultura das relações culturais populares, “apresentando-se, dessa forma, como
uma importante oportunidade estratégica para intervenção no campo da cultura
popular” (p. 337), assim se pode dizer que é um momento peculiar para se propor
a questão da cultura popular negra.
Estamos vivendo o espaço mais
produtivo culturalmente e isso não é simplesmente uma abertura dentro dos
espaços dominantes. É também o resultado de políticas culturais da diferença, “de
lutas em torno da diferença, da produção de novas identidades e do aparecimento
de novos sujeitos no cenário político”. Isso não é válido tão somente para a
raça, mas para outras etnias marginalizadas, assim como o feminismo e as
políticas sexuais no movimento de gays e lésbicas, como resultado de um novo
tipo de política cultural. Essa luta em torno da diferença é chamada hegemonia
cultural – que não significa "vitória ou dominação" - trata-se apenas
de cambiar “as disposições e configurações do poder cultural e não se retirar
dele”.
No que diz respeito à cultura
popular, Hall fala sobre o que ressoa a palavra "popular" e o seu
papel. Apesar de ter um certo sentido, pois a cultura popular se fundamenta nas
experiências cotidianas de pessoas comuns, prazeres, memórias e tradições de um
povo. Por isso que muitas vezes ela está associada ao que Bakhtin chama de
vulgar – o popular, o informal, o grotesco, o lado inferior. “O papel do
popular na cultura popular é o de fixar a autenticidade das formas populares (...)
permitindo vê-las como expressão de uma vida social subalterna específica, que
resiste a ser constantemente reformulada enquanto baixa e periférica”. É o que
Gramsci chamou de “nacional popular”, pois este entende que é no terreno do
senso comum que a hegemonia cultural é produzida e se torna objeto de lutas.
Quanto à cultura popular negra, é
conceituada como um espaço contraditório e de constante contestação, não
podendo ser reduzida aos termos das simples “’oposições binárias’ habitualmente
usadas para mapeá-la: alto ou baixo, autêntico versus inautêntico (...)”, pois
existem sempre posições a serem conquistadas.
Hall conclui o seu ensaio com
dois pensamentos. O primeiro é que “lembrando que a cultura popular,
mercantilizada e estereotipada, não constitui, como às vezes pensamos, a arena
onde descobrimos que realmente somos, a verdade da nossa experiência (...); O
segundo é que “embora pareça que o terreno do popular seja edificado sobre o
binarismo, não o é”.
Junto às comemorações da Semana
da Consciência Negra aconteceu hoje um fato muito importante para a sociedade
brasileira: o ministro Joaquim Barbosa foi empossado nesta quinta-feira (22)
como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ). É uma importante conquista para a comunidade negra brasileira,
visto que ele será o primeiro ministro negro a ocupar a cadeira da presidência
do Supremo.
A cerimônia de posse foi
conduzida pelo ministro com mais tempo de corte, Celso de Mello, que foi
responsável por dar posse ao novo presidente.
Barbosa assinou às 15h34 o termo
de compromisso. Antes, fez juramento: "Prometo cumprir os deveres do cargo
de presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça em
conformidade com as leis", afirmou Barbosa.
Em seguida, foi empossado como
vice-presidente do STF e do CNJ o ministro Ricardo Lewandowski: "Prometo
bem e fielmente cumprir os deveres do cargo de vice-presidente", declarou
Lewandowski.
Divergências sobre o relatório
final e sobre a forma de conduzir o julgamento do mensalão provocaram vários
embates entre Barbosa e Lewandowski.
A presidente Dilma Rousseff e
várias celebridades acompanharam a cerimônia de posse. Entre os famosos que
acompanharam solenidade estão os atores Taís Araújo, Lázaro Ramos e Milton
Gonçalves, o cantor Djavan, a apresentadora Regina Casé e o tricampeão mundial
de Fórmula 1 Nelson Piquet.
Em razão da aposentadoria de
Ayres Britto, que completou 70 anos no último domingo (18), Barbosa assumiu
interinamente a presidência do Supremo na segunda (19). Na quarta (21),
comandou pela primeira vez uma sessão de julgamento do processo do mensalão, do
qual é relator.
A posse de Joaquim Barbosa na presidência do
Supremo Tribunal Federal (STF) é marcada pelo simbolismo da chegada de um negro
a um alto cargo na estrutura de poder, mas movimentos sociais ligados à questão
racial no Brasil se dividem sobre o papel que o ministro deve assumir. Um grupo
defende que é o momento de enfatizar a discussão sobre o racismo e a
desigualdade na sociedade brasileira. Para outros, não cabe ao ministro
levantar bandeiras.
O novo presidente do Supremo em sua vida
acadêmica sempre explorou a desigualdade social e o racismo como tema de teses
e palestras. Mas no exercício profissional, seja no Ministério Público Federal
ou no próprio STF, nunca se levantou como porta-voz da discussão.
Outro importante acontecimento de importante
relevância para a cultura brasileira é a exibição do seriado “Suburbia”. Adorado
pela crítica, mas nem sempre compreendido pelo público, o diretor Luiz Fernando
Carvalho volta seu olhar e as câmeras agora para o subúrbio do Rio de Janeiro,
na série que é transmitida pela Rede Globo, todas as noites de quinta-feira.
O mais interessante e que se encontra
presente, no primeiro momento em que nos deparamos com o seriado às telas, é a
valorização da presença de pessoas negras, uma conquista no espaço televisivo, visando
retratar a identidade e a realidade das pessoas que residem no subúrbio
carioca. O seriado é de suma importância para a construção do pensamento
brasileiro, e sem dúvida proporá uma guinada subjetiva na forma de se pensar as
questões étnico-sociais existentes na diversidade brasileira, tratando-as de
forma reflexiva.
A proposta do diretor foi dar um tom
naturalista à produção, aproximando os personagens o máximo possível da
realidade das comunidades cariocas, sem estereótipos. Atores do grupo teatral
Nós do Morro, com sede na comunidade do Vidigal, integrantes do grupo de rap
Panteras Negras e músicos do Afro Reggae e do Afro Samba foram convocados para
conferir ainda mais realismo ao subúrbio carioca retratado na série.
A produção, que está sendo divulgada como
"Uma história de amor e drama social vivida em meio à rede de afetos que
move a vida no subúrbio carioca", é centrada em Conceição (Débora
Nascimento/Erika Januza), garota que foge do ambiente hostil e miserável dos
fornos de carvão de Minas Gerais para tentar uma vida melhor no Rio de Janeiro.
Mas, ao desembarcar no Aterro do Flamengo, percebe que a violência que conhecia
na cidade natal apenas mudou de nome e forma nessa nova realidade.
Criada a partir das memórias de uma antiga
empregada doméstica de Luiz Fernando Carvalho, Suburbia deverá ter um
tratamento estético menos estilizado do que aquele visto em produções
anteriores do diretor, como Hoje É Dia de Maria (2005) e A Pedra do Reino
(2007). O tom deverá ser mais próximo de Cidade dos Homens, outra série com
temática semelhante e que foi ao ar entre 2002 e 2005, com direção de Guel
Arraes. Não à toa, ambas têm o escritor Paulo Lins (autor também de Cidade de
Deus) como consultor e roteirista. Em entrevista, Lins anuncia Suburbia como um
marco da TV brasileira.
Vejo nestes dois acontecimentos, um no âmbito
jurídico brasileiro e outro no âmbito ficcional, mais um passo na conquista pelo
firmamento de uma identidade étnica brasileira. Oxalá que nesse nosso
maravilhoso país, berço de muitas diversidades, se encaminhe cada vez mais para
a convivência pacífica e o tratamento igualitário a todos os grupos e raças.
Muito axé a todos!!!