quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Identidade Étnica: Stuart Hall, Semana da Consciência Negra, "Suburbia" e Joaquim Barbosa


Olá! Levando em consideração o fato de estarmos passando pela Semana da Consciência negra, que tem como norteadora o dia 20 de novembro, em que se comemora o Dia da Consciência Negra, remeto ao texto de Stuart Hall, no qual ele já propõe um questionamento já no título: “Que Negro é esse na Cultura Negra?” Creio ser pertinente que reflitamos acerca de acontecimentos atuais com base nas reflexões de Hall para que possamos perceber a importância do que se está comemorando, que não se contém apenas em uma semana ou um feriado (em alguns municípios o Dia da Consciência Negra é estipulado feriado), constitui um firmamento étnico de respeito tanto à raça quanto à cultura negras. A seguir, segue uma leitura do ensaio de Hall, acompanhada de acontecimentos recentes e de importante relevância para a conquista dos direitos étnico-raciais.


Hall inicia o seu ensaio com uma pergunta – Que tipo de momento é este para se colocar a questão da cultura popular negra? – e é com base nela que discorre o seu texto. Ao falar de “momento”, o autor nos lembra que devemos ter em mente que eles têm sua especificidade histórica, uma vez que estes são sempre conjunturais. Ainda que estes momentos apresentem semelhanças e continuidades com outros momentos, jamais poderão ser “o mesmo momento”. E essa reunião do que é semelhante e diferente que definirá não só a especificidade do momento, como também a especificidade da questão, logo, “as estratégias políticas com as quais se tenta intervir na cultura popular, bem como com a forma e o estilo da teoria e crítica cultural que precisam acompanhar essa combinação” (p. 337).
Para melhor compreender essa especificidade do momento, Hall apud West aponta três grandes eixos: “O primeiro é o deslocamento dos modelos europeus de alta cultura, da Europa enquanto sujeito universal da cultura (...); O segundo é o surgimento dos EUA como potência mundial e, consequentemente, como centro de produção e circulação global de cultura (vale lembrar que esse surgimento ocorre de maneira simultânea, pois há ‘o deslocamento e uma mudança hegemônica da definição de cultura)’; O terceiro eixo é a descolonização do Terceiro Mundo, marcado culturalmente pela emergência das sensibilidades descolonizadas”. (p. 335-6). Fica evidente que todos estes três eixos estão inseridos no contexto americano.
Para o referido autor esse descentramento e/ou deslocamento de que fala em um dos eixos representa uma abertura para novos espaços de contestação, causando assim uma importante mudança na alta cultura das relações culturais populares, “apresentando-se, dessa forma, como uma importante oportunidade estratégica para intervenção no campo da cultura popular” (p. 337), assim se pode dizer que é um momento peculiar para se propor a questão da cultura popular negra.
Estamos vivendo o espaço mais produtivo culturalmente e isso não é simplesmente uma abertura dentro dos espaços dominantes. É também o resultado de políticas culturais da diferença, “de lutas em torno da diferença, da produção de novas identidades e do aparecimento de novos sujeitos no cenário político”. Isso não é válido tão somente para a raça, mas para outras etnias marginalizadas, assim como o feminismo e as políticas sexuais no movimento de gays e lésbicas, como resultado de um novo tipo de política cultural. Essa luta em torno da diferença é chamada hegemonia cultural – que não significa "vitória ou dominação" - trata-se apenas de cambiar “as disposições e configurações do poder cultural e não se retirar dele”.
No que diz respeito à cultura popular, Hall fala sobre o que ressoa a palavra "popular" e o seu papel. Apesar de ter um certo sentido, pois a cultura popular se fundamenta nas experiências cotidianas de pessoas comuns, prazeres, memórias e tradições de um povo. Por isso que muitas vezes ela está associada ao que Bakhtin chama de vulgar – o popular, o informal, o grotesco, o lado inferior. “O papel do popular na cultura popular é o de fixar a autenticidade das formas populares (...) permitindo vê-las como expressão de uma vida social subalterna específica, que resiste a ser constantemente reformulada enquanto baixa e periférica”. É o que Gramsci chamou de “nacional popular”, pois este entende que é no terreno do senso comum que a hegemonia cultural é produzida e se torna objeto de lutas.
Quanto à cultura popular negra, é conceituada como um espaço contraditório e de constante contestação, não podendo ser reduzida aos termos das simples “’oposições binárias’ habitualmente usadas para mapeá-la: alto ou baixo, autêntico versus inautêntico (...)”, pois existem sempre posições a serem conquistadas.
Hall conclui o seu ensaio com dois pensamentos. O primeiro é que “lembrando que a cultura popular, mercantilizada e estereotipada, não constitui, como às vezes pensamos, a arena onde descobrimos que realmente somos, a verdade da nossa experiência (...); O segundo é que “embora pareça que o terreno do popular seja edificado sobre o binarismo, não o é”.


Junto às comemorações da Semana da Consciência Negra aconteceu hoje um fato muito importante para a sociedade brasileira: o ministro Joaquim Barbosa foi empossado nesta quinta-feira (22) como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). É uma importante conquista para a comunidade negra brasileira, visto que ele será o primeiro ministro negro a ocupar a cadeira da presidência do Supremo.
A cerimônia de posse foi conduzida pelo ministro com mais tempo de corte, Celso de Mello, que foi responsável por dar posse ao novo presidente.
Barbosa assinou às 15h34 o termo de compromisso. Antes, fez juramento: "Prometo cumprir os deveres do cargo de presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça em conformidade com as leis", afirmou Barbosa.
Em seguida, foi empossado como vice-presidente do STF e do CNJ o ministro Ricardo Lewandowski: "Prometo bem e fielmente cumprir os deveres do cargo de vice-presidente", declarou Lewandowski.
Divergências sobre o relatório final e sobre a forma de conduzir o julgamento do mensalão provocaram vários embates entre Barbosa e Lewandowski.
A presidente Dilma Rousseff e várias celebridades acompanharam a cerimônia de posse. Entre os famosos que acompanharam solenidade estão os atores Taís Araújo, Lázaro Ramos e Milton Gonçalves, o cantor Djavan, a apresentadora Regina Casé e o tricampeão mundial de Fórmula 1 Nelson Piquet.
Em razão da aposentadoria de Ayres Britto, que completou 70 anos no último domingo (18), Barbosa assumiu interinamente a presidência do Supremo na segunda (19). Na quarta (21), comandou pela primeira vez uma sessão de julgamento do processo do mensalão, do qual é relator.
A posse de Joaquim Barbosa na presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) é marcada pelo simbolismo da chegada de um negro a um alto cargo na estrutura de poder, mas movimentos sociais ligados à questão racial no Brasil se dividem sobre o papel que o ministro deve assumir. Um grupo defende que é o momento de enfatizar a discussão sobre o racismo e a desigualdade na sociedade brasileira. Para outros, não cabe ao ministro levantar bandeiras.
O novo presidente do Supremo em sua vida acadêmica sempre explorou a desigualdade social e o racismo como tema de teses e palestras. Mas no exercício profissional, seja no Ministério Público Federal ou no próprio STF, nunca se levantou como porta-voz da discussão.


Outro importante acontecimento de importante relevância para a cultura brasileira é a exibição do seriado “Suburbia”. Adorado pela crítica, mas nem sempre compreendido pelo público, o diretor Luiz Fernando Carvalho volta seu olhar e as câmeras agora para o subúrbio do Rio de Janeiro, na série que é transmitida pela Rede Globo, todas as noites de quinta-feira.
O mais interessante e que se encontra presente, no primeiro momento em que nos deparamos com o seriado às telas, é a valorização da presença de pessoas negras, uma conquista no espaço televisivo, visando retratar a identidade e a realidade das pessoas que residem no subúrbio carioca. O seriado é de suma importância para a construção do pensamento brasileiro, e sem dúvida proporá uma guinada subjetiva na forma de se pensar as questões étnico-sociais existentes na diversidade brasileira, tratando-as de forma reflexiva.
A proposta do diretor foi dar um tom naturalista à produção, aproximando os personagens o máximo possível da realidade das comunidades cariocas, sem estereótipos. Atores do grupo teatral Nós do Morro, com sede na comunidade do Vidigal, integrantes do grupo de rap Panteras Negras e músicos do Afro Reggae e do Afro Samba foram convocados para conferir ainda mais realismo ao subúrbio carioca retratado na série.
A produção, que está sendo divulgada como "Uma história de amor e drama social vivida em meio à rede de afetos que move a vida no subúrbio carioca", é centrada em Conceição (Débora Nascimento/Erika Januza), garota que foge do ambiente hostil e miserável dos fornos de carvão de Minas Gerais para tentar uma vida melhor no Rio de Janeiro. Mas, ao desembarcar no Aterro do Flamengo, percebe que a violência que conhecia na cidade natal apenas mudou de nome e forma nessa nova realidade.
Criada a partir das memórias de uma antiga empregada doméstica de Luiz Fernando Carvalho, Suburbia deverá ter um tratamento estético menos estilizado do que aquele visto em produções anteriores do diretor, como Hoje É Dia de Maria (2005) e A Pedra do Reino (2007). O tom deverá ser mais próximo de Cidade dos Homens, outra série com temática semelhante e que foi ao ar entre 2002 e 2005, com direção de Guel Arraes. Não à toa, ambas têm o escritor Paulo Lins (autor também de Cidade de Deus) como consultor e roteirista. Em entrevista, Lins anuncia Suburbia como um marco da TV brasileira.

Vejo nestes dois acontecimentos, um no âmbito jurídico brasileiro e outro no âmbito ficcional, mais um passo na conquista pelo firmamento de uma identidade étnica brasileira. Oxalá que nesse nosso maravilhoso país, berço de muitas diversidades, se encaminhe cada vez mais para a convivência pacífica e o tratamento igualitário a todos os grupos e raças. Muito axé a todos!!!

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